Jericoacoara é uma praia que fica no município de Jijoca de Jericoacoara, que por sua vez fica no Estado do Ceará, no Brasil. Mais ou menos a 300km da capital do estado, Fortaleza.
Esta praia situada numa vila de pescadores isolada por enormes dunas de areia era desconhecida, até para os brasileiros, até ao dia que o jornal Washington Post em 1994, publicou um artigo sobre praias exóticas e desconhecidas no mundo.
A notícia rapidamente chegou à imprensa brasileira, mas não havia a tecnologia de hoje, internet, etc, e o que os jornais publicaram foi: O Washington Post elegeu Jericoacoara com uma das 10 praias mais bonitas do Mundo. O verdadeiro: quem conta um conto, acrescenta um ponto!
Embora o titulo fosse inspirador, chegar a Jericoacoara nunca foi fácil: oito horas de autocarro, mais duas num veículo que pudesse andar na areia. Chegando lá, não havia alojamento, e o melhor que se conseguia era uma cama de rede, na casa de um pescador simpático.
Mais tarde, em 2004, tornou-se um destino internacional quando recebeu o titulo de a Melhor praia do Mundo, atribuído pela Lonely Planet.
Nunca um local sofreu uma transformação tão grande em tão pouco tempo, como esta praia.
A vila viu os seus visitantes de mochila de campismo desaparecerem, e darem lugar a estrangeiros de classe alta. O dinheiro que antes ajudava os pescadores locais, agora está a ser, quase todo, canalizado para os cofres de hotéis italianos, britânicos e americanos.
Devido à insegurança de muitos lugares no Brasil, Jeri ganhou reputação e ainda conseguiu manter o charme e tranquilidade por cerca de dez anos. Era um lugar exclusivo, pois as 6 a 8 horas de caminho ainda afugentam muitas pessoas.
Hoje existe um aeroporto a 32km de Jeri, a funcionar desde 2017 com voos mais ou menos regulares, apenas provenientes de algumas cidades brasileiras . No entanto, as companhias aéreas conhecem este destino e os bilhetes não são muito acessíveis, fazendo com que a opção mais perto seja Fortaleza.
Em 2017 os habitantes uniram-se no sentido de proteger a vila, as tradições, evitar que Jeri se tornasse a próxima Praia de Punta Cana, e se aproximasse mais de Fernando Noronha com apenas 420 visitantes por dia, e taxas de preservação ambiental caras.
Como é Jericoacoara neste momento?
Desde Setembro de 2017 os governantes implementaram a Taxa de Preservação Ambiental. Se em Fernando Noronha custa cerca de 16€/dia,e utilizar os trilhos na natureza para passeios custa mais 2,35€, em Jeri a taxa é de 5 Reais/dia, ou seja 1,20€, e os passeios nas dunas são isentos de taxa.
É mais barato, é certo, mas isso conduz a menor eficácia no objectivo que tinham: diminuir os visitantes, proteger e preservar amostras dos ecossistemas costeiros, assegurar a preservação dos recursos naturais e proporcionar pesquisa científica, educação ambiental e turismo ecológico.
Jericoacoara não tem arruamentos, nem estradas alcatroadas. Ou seja, estamos sempre, literalmente na praia, com os pés enterrados na areia, quer seja nas ruas do comércio e restauração, quer seja dentro de muitas lojas. Sapatos fechados são um martírio, e saltos altos nem se vêm, carreguem as malas (sem rodinhas) com apenas chinelos e sandálias.
Para carrinhos de criança não é bom, vimos uma família adaptada ao ambiente em que a mãe empurrava e o pai puxava por uma corta atada no poisa-pés. Mas, não parecia uma tarefa nada fácil. Apenas alguns carrinhos de três rodas grandes passeavam na maré baixa, quando a areia está lisa e dura.
Não há multibancos em Jericoacoara.
Se não levantarem dinheiro em Fortaleza ou alguma localidade das redondezas, em Jericoacoara não o poderão fazer. Nem todos os restaurantes e lojas possuem pagamentos com cartão.
Desde sempre, o que atraiu as pessoas a esta pequena localidade foram as imensas dunas, a calma do mar, e o vento. O mesmo vento implacável que há milénios empurra as dunas, transformando a paisagem a cada dez anos, é o mesmo vento que atrai milhares de praticantes de windsurf e kitesurf de todo mundo, especialmente de Julho a Dezembro.
Foram estes surfistas que trouxeram, e mantêm, o ambiente descontraído da vila. De dia circulam com pranchas e equipamentos debaixo do braço, e à noite fazem festas na praia, e nas varandas das pousadas. Todo o barulho termina, implacavelmente, às 02 horas da manhã.
Os filhos dos pescadores adaptaram-se. Os únicos veículos motorizados que circulam na vila, têm uma licença turística, e são jipes ou buggies. E este negócio de “táxi” e passeios turísticos pelas atracões das redondezas, passou a ser o ganha pão destas famílias. O fluxo de carros é encaminhado para estacionamentos fora do centro, na entrada da vila de Jeri ou no centro de Jijoca, o que levou a anular o número de atropelamentos e engarrafamentos de há dez anos.
Atropelamentos… sim ocorriam em grande número porque não há iluminação pública na vila. A única luz vem dos edifícios, e só há duas décadas. Se ficarem, como nós, fora do centro, vão ter de caminhar às escuras. Depois de alguns dias habituamos, mas há um enorme factor sorte que não tem a ver com o sentido de orientação, mas sim com os cavalos ou burros que por ali passeiam soltos.
Uma boa forma de se deslocar é de cavalo. Existem várias “praças” de cavalos, com carruagem, e com algum poder de negociação podem evitar fazer o caminho a pé, pela areia e às escuras.
Há cavalos e burros, e muitas vezes passeiam soltos por todo lado. Porém, têm donos.
Há pouquíssimo turismo familiar, e conseguimos perceber porquê. É necessário ser um apreciador de lugares exóticos, sem ter medo das dificuldades. É cansativo chegar, é cansativo circular, não há absolutamente nada para crianças e cabe a nós fazer de qualquer actividade, uma actividade atractiva para todos. Há areia em todo lado, a toda a hora, e para alguns pais isso pode ser stressante.
Porque vale a pena ir a Jericoacoara, a vila dos abraços?
Jericoacoara é aquele lugar, que precisamos experimentar para depois gostar. É certo que não sabíamos de metade das condicionantes do local, mas temos a certeza que não nos fariam mudar de ideia, muito pelo contrário. Ficamos com uma vontade imensa de voltar, e por mais tempo.
Jericoacoara é um oásis no meio de gigantes dunas. Não são dunas como o deserto do Sahara, ou os desertos no médio Oriente, são dunas majestosas de areia tão branca que parecem montes de sal, viradas para o mar como um fortificação a observar os navegadores.
Jericoacora é despida de roupas caras e sapatos apertados. O ambiente é descontraído, cheira a bronzeador solar e a frutas. Vamos a pé a todo lado, as pessoas sorriem acolhedoras e sentimo-nos em casa.
Muitos funcionários do comércio falam espanhol. São os Brasilinos (Argentinos imigrantes), que trouxeram a multiculturalidade à vila, misturando os hábitos e os costumes destes dois países vizinhos.
Jericoacoara é um local para descansar. Existem apenas três ou quatro atracções que nos fazem sair deste ambiente ludibriante, e o resto é só sossego, contemplação das estrelas e mergulhos. Para apreciadores de Ecoturismo, este local é perfeito, pois mantém a natureza rústica.
No autocarro no caminho até Jijoca de Jericoacoara, onde passaríamos para um jipe 4X4 para mais 23km, o guia avisava as pessoas entre piadas e tom sério: ” Se não gostam de sol, mar quente, vento e areia, paisagens espectaculares, gastronomia boa, vão para Jeri comer o pão que o diabo amassou”. Numa frase resumiu tudo.
Bons Passeios!
4 Comments
Estive em Jeri há quase 20 anos e tenho as melhores memórias do local, mas imagino que esteja de facto muito mudado. Que não o estraguem muito é o que desejo.
Sabes bem o que o turismo pode fazer numa vila, para o bem e para o mal. A chegada da taxa de preservação ambiental não parece ser coerente com a instalação de um aeroporto a 32km, mas é um esforço da população para travar o número de visitantes. Multidões à parte, não perdeu o charme de vila piscatória 🙂 há 20 anos devia ser mais tranquilo, parece-me!